sábado, 5 de novembro de 2011

Doutrina: Princípios em Direito Previdenciário

Princípio da SolidariedadeAtendendo ao chamado constitucional, estampado no art. 3º inciso I da Carta Maior, surge o princípio da solidariedade, o qual sustenta em seu cerne todo o regime previdenciário.
Tal princípio norteia e influência diretamente toda a estrutura da seguridade social, a qual, sem tal fundamento não prosperaria.
Do próprio conceito de seguridade social, trazido pelo art. 194 da Constituição, percebemos que “o dever constitucional, imposto aos Poderes públicos e à sociedade demonstram que a solidariedade é o fundamento da seguridade social” (Marisa Ferreira dos Santos, Saraiva, 2010).
Nesse sentido segue o entendimento da jurisprudência nacional:

Ementa:PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXERCÍCIO CONCOMITANTE DE ATIVIDADES REMUNERADAS SUJEITAS AO RGPS. SEGURADO OBRIGATÓRIO. PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DO VALOR RECOLHIDO EXCEDENTE AO LIMITE MÁXIMO DO SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO. RECURSO ESPECIAL DO INSS PROVIDO. STJ REsp 691837 / AL

O entendimento emanado da decisão deixa claro que, tal princípio age diretamente no financiamento da previdência, a egrégia 5ª turma do STJ, deixou bem claro no acórdão que, o financiamento da previdência é sim fruto da solidariedade humana, devendo, aqueles que estão sujeitos ao regime efetuar as contribuições devidas, ainda que estas extrapolem o teto máximo de contribuição, no caso de o segurado exercer mais de uma atividade sujeita ao Regime Geral da Previdência Social.
Quanto ao conceito de tal princípio verificamos que a solidariedade humana pode ser entendida tanto como uma necessidade, quanto como um fruto da compaixão humana para com seus semelhantes, oriundas sobretudo dos valores cristãos do mundo ocidental; porém, independentemente da origem, traz à sociedade contemporânea a necessidade de não pensar apenas em si, mas em todos, arcando conjuntamente com o risco social.
Ressalte-se ainda que “Somente a partir da ação coletiva de repartir os frutos do trabalho, com a cotização de cada um em prol do todo, permite-se a subsistência do sistema previdenciário” (Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, Conceito – 2010), assim, verificamos que, a convivência do ser humano em sociedade gera, não apenas a necessidade de se garantir direitos, mas também de se criar deveres a serem cumpridos.
A nosso ver, tal princípio é de fundamental importância, não se cogitando qualquer possibilidade de seu afastamento, seja em qual for à situação. Sua atuação é fundamental para a garantia daquilo que busca a Constituição como um todo, e especialmente quanto à seguridade social.
Sendo fundamento da previdência, tal princípio não poderia jamais ser afastado, pois para se tirar a base deve-se destruir a construção, dessa forma o afastamento de tal princípio condenaria à morte todo o sistema previdenciário brasileiro, ou seja, seria necessário antes adotarmos outro modelo de previdência, diverso do atual.

Princípio da Universalidade da Cobertura e do AtendimentoA universalidade da cobertura determina que a proteção social deve alcançar todos os eventos previstos, (contingências), a fim de se garantir a subsistência daqueles que necessitam, quanto a universalidade do atendimento, verificamos que todos aqueles que necessitam de atendimento devem o ter de forma equivalente.
Tal princípio, no dizer de Marisa Ferreira dos Santos garante que:
“Todos no território nacional tenham acesso ao mínimo indispensável à sobrevivência com dignidade. Impõe ao legislador o respeito à igualdade (art. 5º), impedindo que haja excluídos da proteção social que a seguridade deve garantir”. (Marisa Ferreira dos Santos, Saraiva, 2010).
Jurisprudencialmente verificamos que tal princípio esta ligado à efetividade da proteção previdenciária. Senão vejamos:

Ementa: PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/91. CÔMPUTO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES DO STJ. PEDIDO RESCISÓRIO PROCEDENTE
STJ AR 3242 / SC AÇÃO RESCISÓRIA 2005/0009583-0

Tal decisão, conforme explanado em seu acórdão teve como fundamento o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento, no sentido de que, tal princípio impõe uma interpretação normativa que garanta ao segurado uma efetiva proteção, determinando a possibilidade da contagem do tempo de serviço do trabalhador rural menor de quatorze anos, trabalhados em regime de economia familiar, ainda que o trabalho só seja permitido pela CF, a partir dos quatorze anos.
Dessa forma, a proteção social abrange tais trabalhadores, sendo a proteção previdenciária estendida universalmente protegendo tais segurados.

Uniformidade e Equivalência dos Benefícios e Serviços às Populações Urbanas e Rurais.Por uniformidade deve-se entender que “trabalhadores urbanos e rurais tem direito ao mesmo plano de proteção social” (Marisa Ferreira dos Santos, Saraiva, 2010), esta ligada aos aspectos objetivos, ou seja, às contingências a serem abrangidas, que devem ser as mesmas, tanto para o segurado urbano quanto ao rural.
Por equivalência é importante inicialmente lembrar que equivalência não significa igualdade, no sentido formal da palavra, mas apenas no sentido material, ou seja, “os critérios para a concessão das prestações da seguridade são os mesmos; porém, tratando-se de previdência social, o valor de um benefício pode ser diferenciado” (Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, Conceito – 2010).

Ementa:APOSENTADORIA - TEMPO DE SERVIÇO - RURAL E URBANA - SOMATORIO. A regra da reciprocidade prevista no par. 2. do artigo 202 da Constituição Federal e restrita ao tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada. A referencia as espécies rural e urbana informa a abrangência nesta ultima. A seguridade social com a universalidade da cobertura e do atendimento, bem como a alcançar a uniformização e equivalência dos benefícios e serviços as populações urbanas e rurais resulta do teor do artigo 194,submetendo-se tais princípios ao que previsto nos artigos 195, par. 5., e 59, os dois primeiros do corpo permanente da Lei Básica Federal e o último das Disposições Transitórias. A aposentadoria na atividade urbana mediante junção do tempo de serviço rural somente e devida a partir de 5 de abril de 1991, isto por força do disposto no artigo 145 da Lei n. 8.213, de 1991, e na Lei n. 8.212/91, no que implicaram a modificação, estritamente legal, do quadro decorrente da Consolidação das Leis da Previdência Social - Decreto n. 89.312, de 23 de janeiro de 1984.

No caso em tela percebemos que a importância de tal princípio como redutor das desigualdades sociais, especialmente quando lembramos que o Brasil é um país de dimensões continentais, e que boa parte de sua população vive em áreas rurais, necessitando especialmente da proteção do Estado.

Seletividade e Distributividade na Prestação de Benefícios e Serviços
Por tal princípio verificamos que, a previdência seleciona e distribui renda, dessa forma, nem todo segurado tem direito a todo benefício.
Assim, “não há um único benefício ou serviço, mas vários, que serão concedidos e mantidos de forma seletiva, conforme a necessidade da pessoa” (Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, Conceito – 2010).
Quanto à distributividade, verificamos que as prestações são distribuídas de forma a garantir o bem-estar social àqueles que dependem de uma garantia, ainda que mínima de sua condição social, uma forma de se diminuir as desigualdades sócias.
Vejamos a seguinte decisão:

EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO. PENSÃO PREVIDENCIÁRIA. MORTE DE EX-SERVIDOR. COMPANHEIRA. INSCRIÇÃO PRÉVIA. PRESCINDIBILIDADE. UNIÃO ESTÁVEL. COMPROVAÇÃO. A Lei nº 10.366/90, em seu art. 10, determina que, para fins de prestação previdenciária, são dependentes do segurado, preferencial e exclusivamente, o cônjuge, o companheiro e o filho. A ausência de inscrição prévia da companheira não representa óbice ao recebimento de pensão pela morte de ex-servidor, quando encontrar-se devidamente comprovada a união estável.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
APELAÇÃO CÍVEL / REEXAME NECESSÁRIO Nº 1.0024.07.432371-8/002

No presente caso, verificamos a clássica atuação do princípio, sendo sua aplicação garantida por meio do judiciário, dessa forma seleciona-se uma contingência, no caso a morte do segurado, em seguida distribui-se renda, garantindo assim a subsistência de seus dependentes, no caso a companheira.

Princípio da Irredutibilidade do Valor do Benefício
Tal princípio é auto explicativo, e busca garantir que o valor do benefício deve ser mantido, não podendo sofrer alteração em seu valor nominal.
Nesse sentido já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça:

Ementa :TRIBUTÁRIO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. LEI ESTADUAL. INSTITUIÇÃO DE ALÍQUOTA DE 11%. SERVIDORES ATIVOS. INEXISTÊNCIA DE IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. ADIN Nº 790/DF. CONSTITUCIONALIDADE.
RMS 26551 / TO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA
2008/0058171-8.

Em tal decisão o egrégio tribunal entendeu, com base em precedente do STF (ADIn nº 790/DF), que a majoração de alíquota de contribuição previdenciária não fere o princípio constitucional da irredutibilidade dos vencimentos, deixando claro a postura de que tal garantia restringe-se ao valor nominal do benefício.
O mencionado princípio revela-se de fundamental importância, especialmente no tocante à garantia da dignidade humana, lembramos que tal garantia deve ser mantida a todo custo, sendo imprescindível, para tanto que os valores dos benefícios recebidos pelos beneficiários atinjam tal finalidade, não comportando, nesse sentido a possibilidade de redução do valor recebido.

Equidade na Forma de Participação e CusteioTal princípio determina que cada classe de contribuinte contribua de forma igualitária, custeando assim, todo o sistema previdenciário.
É importante ressaltar que “trata-se de norma principiológica em sua essência, visto que a participação equitativa de trabalhadores, empregadores, e Poder Público no custeio da seguridade social é meta, objetivo, e não regra concreta.” (Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, Conceito – 2010).
Ressalte-se, sobretudo o sentido de equidade, que dista daquele de igualdade formal, significando aquela igualdade material clássica, onde os desiguais são tratados tanto quanto sua desigualdade, vejamos a seguinte decisão:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. APOSENTADO QUE RETORNA À ATIVIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. I - A contribuição previdenciária do aposentado que retorna à atividade está amparada no princípio da universalidade do custeio da Previdência Social. Precedentes. II - Agravo regimental improvido. (AI 668531 AgR / DF - DISTRITO FEDERAL)

Na decisão exarada acima, o Supremo Tribunal Federal, deixa claro, ainda que usando nomenclatura diversa daquela utilizada pela Constituição, que todos os setores devem contribuir para a previdência, dessa forma, nada há de errado na contribuição por parte daqueles que, embora já tenham se aposentado, retornam à atividade, sendo devidas as suas contribuições.
A nosso ver, em que pese a situação atual, percebemos ser fundamental a manutenção de tal princípio, fez que, embora o Poder Público seja o grande financiador da previdência, há que se trabalhar para um maior equilíbrio no custeio da previdência.

Diversidade na Base de FinanciamentoA diversidade na base de financiamento do sistema previdenciário visa garantir que ônus do sistema previdenciário não recaia unicamente sobre apenas uma classe de contribuintes, fortalecendo assim a idéia de um sistema financiado por diversas fontes de custeio, nesse sentido.

Ementa:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. ADICIONAL DE FÉRIAS E 13º SALÁRIO. BASE DE CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INCIDÊNCIA. VERBAS DE CARÁTER REMUNERATÓRIO. INEXISTÊNCIA DE INFRINGÊNCIA DO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DO ART. 458, II CPC. SÚMULA 282/STF. REsp 956289 / RS (STJ).

Ressalte-se, sobretudo aquilo que os ministros deixaram claro em seus votos, a respeito do custeio da previdência: “seu custeio obedece ao princípio da universalidade, conforme preceitua o art. 195 da CF/88, devendo ser financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta”.
É importante ressaltar que tal princípio garante e legitima várias fontes de custeio da previdência, como a receita de concursos de prognósticos, e possibilita a instituição de outras fontes.
“O custeio (da previdência) é feito por meio de recursos orçamentários da União, dos Estados, Distrito Federal e Municípios, além de contribuições pagas pelo empregador, pela empresa ou entidade a ela equiparada, pelo trabalhador, pelas contribuições incidentes sobre as receitas de concurso de prognóstico e pelas contribuições pagas pelo importador de bens ou serviços.” (Marisa Ferreira dos Santos, Saraiva, 2010).

Caráter Democrático e Descentralizado da Administração Mediante Gestão QuadripartiteTal princípio garante, ao menos em tese, a participação na gestão previdenciária dos vários setores que compõe o financiamento da previdência, ou seja, os trabalhadores da ativa, os aposentados, os empregadores e o governo.
Percebemos que a intenção do legislador ao instituir tal princípio é garantir uma maior participação da sociedade nas decisões tomadas, garantindo assim que, “a gestão dos recursos, programas, planos, serviços e ações, nas três vertentes da seguridade social, em todas as esferas de poder, deve ser realizada mediante discussão com a sociedade”. (Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, Conceito – 2010).

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MP 1911-9/99. NORMA DE NATUREZA SECUNDÁRIA. VIOLAÇÃO INDIRETA. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME EM SEDE DE CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE. 1. É incabível a ação direta de inconstitucionalidade quando destinada a examinar ato normativo de natureza secundária que não regule diretamente dispositivos constitucionais, mas sim normas legais. Violação indireta que não autoriza a aferição abstrata de conformação constitucional. Ação direta de inconstitucionalidade não conhecida.
ADI 2065 / DF - DISTRITO FEDERAL (STF).

Na decisão supra percebemos o não conhecimento da ADI, vez que está insurgia contra ato da administração pública que criava vários conselhos da previdência social; na fundamentação os ministros do STF, entenderam por bem não acolher a ADI, no entanto deixaram claro que a criação desses conselhos era um desejo constitucional, e que, como princípio deveria ser atingido.
A nosso ver tal princípio é de fundamental importância para a construção de uma sociedade mais justa e fraterna, sem falar é claro no fortalecimento da democracia advindo das políticas que surgem daí, dessa forma, merece destaque a afirmativa de Isabella Monteiro Gomes no sentido de que “a democracia em sua vertente deliberativa possui como núcleo um procedimento de discussão e solução pública, por sujeitos livres e iguais, sobre os interesses comuns da coletividade, a fim de conferir legitimidade à atuação do poder público...” (Isabella Monteiro Gomes – Arraes – 2011). Assim, fortalece sobretudo à democracia.
Para citar: Silva, Luis Carlos Vieira da, Princípios em Direito Previdenciário – 2011, dinível em http://minasadv.blogspot.com/2011/11/doutrina-principios-em-direito.html

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